logo text
Add to Library
logo
logo-text

Download this book within the app

Chapter 6 Porque eu não choro

Deixamos os muros do castelo num automóvel simples e sem nenhuma logomarca do reino, provavelmente tudo organizado premeditadamente por meu pai e Alexander. Até a placa era comum. Creio que tenha sido comprado somente com a finalidade de nos atender pelos próximos cinco meses.
Alexander dirigia e Mia foi na frente com ele. Eu atrás. Eu conhecia as ruas próximas e as grandes lojas caras da avenida principal do centro de Avalon. Mas era a primeira vez que eu saía me sentindo realmente livre.
- Acho que meu coração vai sair pela minha boca. – confessei.
Os dois riram e eu continuei:
- Obrigada por estarem comigo.
Mia virou a segurou minha mão:
- Amo você, amiga.
- Também te amo, Mia.
- Eu estou sendo pago e muito bem pago para fazer isso. Caso contrário, não faria. – disse Alexander.
- Por que você tenta estragar tudo, Alexander? – perguntei sentindo tristeza com as palavras dele.
- Eu não quero estragar tudo, Satini. Eu só não acho isso prudente. Você foi poupada e escondida de Avalon a vida toda. Agora seu pai permite que você transite normalmente... A vida aqui fora é perigosa por si só. Sem contar que temos a Coroa Quebrada. Faz um bom tempo que não venho para cá, mas já soube que aquele lado continua cruel e vingativo.
- O que você sabe exatamente sobre a Coroa Quebrada, Alexander? Refiro-me ao fato de não ser somente um lugar onde os rebeldes moram.
- Bem, já que você está saindo do castelo, acho justo você saber um pouco sobre o que acontece aqui fora. Claro que eu não vou permitir que você chegue sequer perto de lá, mas é bom que fique ciente.
- Estou esperando.
- Seu pai não é bem quisto pela população de Avalon, a não ser nas redondezas do castelo, onde moram os mais ricos e com algum tipo de poder: a corte, grandes empresários etc. Obviamente não frequentaremos outros lugares a não ser estes e não há nada que você fale que me faça mudar de ideia.
- Ok, quero saber sobre a Coroa Quebrada.
- Há muito mais tempo do que pensamos, já existia a Coroa Quebrada dentro de Avalon. Acho que antes mesmo de você nascer. Iniciou como um pequeno movimento contra seu pai logo que ele assumiu no lugar de Emy Beaumont. E mesmo depois da morte dela, continuou a existir esta rebelião que não aceita o poder dos Beaumont... Ou da monarquia, não sei exatamente.
- Sempre houve rebeldes e descontentes com o governo em qualquer lugar, desde que o mundo se organizou em poderes. Por que não teria em Avalon? Isso é normal.
- Sim, isso não existe só aqui. Mas este grupo “descontente” passou a ficar grande demais... O suficiente para quase ocupar metade de Avalon. Eles se dizem defensores da rainha que não chegou a assumir, Emy Beaumont.
- Mas ela morreu... Como assumiria?
- Eles acreditam que seu pai a matou para ficar com o trono.
- Meu pai pode ter muitos defeitos, mas ele jamais faria isso. Quem mataria a própria irmã pelo poder?
- Eu não estou dizendo que ele fez. – ele me disse estreitando os olhos enquanto me olhava pelo retrovisor. – Estou só contando a história.
- Por que Coroa Quebrada?
- Não sei ao certo... Eu nunca estive lá, embora tenha conhecido algumas pessoas que moram naqueles lados.
- Todos que moram lá são rebeldes descontentes, isso?
- Não tenho certeza. Mas você pode identificar os mais fiéis a causa.
- Como? – perguntei curiosa.
- Eles têm em alguma parte do corpo uma tatuagem de coroa partida ao meio.
- Então se eu encontrar alguém com uma tatuagem assim preciso me afastar? – perguntei.
Ele riu:
- Não encontrará ninguém da Coroa Quebrada por aqui, Alteza.
- Acho que não deve chamá-la assim, irmão. – lembrou Mia.
- Eu vou tentar... Mas às vezes eu não me contenho.
Eu dei de ombros. Alexander era complicado. Para saber sobre a Coroa Quebrada era preciso encontrar alguém que vivesse lá. E eu encontraria esta pessoa. Era este o motivo de eu ter saído do castelo: conhecer Avalon... E encontrar um homem que não fosse o meu príncipe.
Em pouco tempo Alexander estacionou o carro, numa rua já bastante conhecida por mim: a que eu fazia compras.
- Eu não quero descer aqui. – reclamei.
- Por que não?
- Eu já conheço este lugar. – aleguei.
- É verdade. É aqui que ela faz compras sempre.
- Então já conhece fora do castelo. Podemos voltar, Alteza.
- Eu detesto você, Alexander. – disse abrindo a porta e descendo do carro furiosa.
Mia desceu também:
- Sabe que não vai ser nada fácil com ele atrás de nós, não é mesmo? – ela cochichou.
- E como eu vou achar meu príncipe deste jeito?
Ela me olhou confusa:
- Como assim? Você não vai encontrá-lo em cinco meses?
- Estou falando do príncipe encantado.
Ela riu:
- E ele existe?
- Eu vou tentar encontrá-lo.
- Satini Beaumont, não me deixe ainda mais nervosa.
- Vamos comprar uma roupa para a noite, já que estamos aqui. – falei alegremente colocando meu braço sobre os ombros de Mia.
- Quer mesmo ir numa casa noturna?
- Não só quero, como vou. E seu irmão vai junto e não vai contestar.
- E como você vai fazer isso?
- Não sei... Talvez eu dê um beijo nele... Melhor que da primeira vez. – falei ironicamente, sabendo que ele detestaria.
Ela riu:
- Nojo!!!
Olhei para ele andando atrás de nós, mexendo no celular como se nada estivesse acontecendo. Eu precisava me livrar de Alexander ou nada daria certo nos meus meses de liberdade.
Paramos numa loja de departamentos. Eu estava entrando e ela disse:
- Você não vai fazer isso.
- Eu vou. – falei rindo e entrando ansiosa.
- Céus, você está louca... Estou dizendo.
- Vamos comprar uma roupa para a noite... Minha primeira balada.
- Cansada dos bailes clássicos, Alteza? – Alexander ironizou.
- Pare de me chamar assim, seu idiota.
- É a força do hábito.
- Desde quando você me chama assim?
- Desde que voltei e percebi quem é você.
- E quem eu sou, Alexander?
- Alteza, princesa, herdeira da porra toda.
- Alexander, por que você está sendo tão otário? É Satini, que cresceu conosco, como nossa irmã. – falou Mia tentando dizimar a tensão entre mim e ele.
- Ela não é nossa irmã, Mia. E nunca será. Somos somente seus empregados e sempre será desta forma.
Eu senti uma lágrima escorrer do meu rosto. Eu não esperava ouvir aquilo dele. Eles eram a única família que eu conheci e ele me tratava daquela forma por qual motivo? O que eu havia feito para ele para que tivesse tanto ressentimento contra mim?
Mia me abraçou e eu limpei a lágrima teimosa e sorri:
- Está tudo bem, Mia. – falei afastando-a.
Saí de perto dele, tentando fazer o que eu realmente havia ido fazer ali: comprar. Senti a mão dele no meu braço, delicadamente:
- Me desculpe.
- Tudo bem. – falei sem olhar no rosto dele.
Eu não costumava chorar. Eu sempre fui uma pessoa forte. A vida me fez assim. Eu sempre considerei Mia, Alexander e Léia minha família, até mais que meu pai. Mas é claro que eu sabia que eles não eram minha família de verdade. Eu era sozinha, absolutamente sozinha no mundo. E isso me fez forte para aguentar muitas coisas. Eu muito chorei sozinha na minha cama enquanto todos dormiam, lamentando por não ter uma mãe, por meu pai sequer se importar com a minha existência, por ninguém dentro do castelo saber quem eu era, por eu não ter contato com o mundo externo, não ir à escola e não ter uma vida normal. Com o tempo, parece que minhas lágrimas secaram. E eu não tinha mais espaço para a dor dentro de mim. Eram poucas as situações que me emocionavam ou me entristeciam. Mas as palavras de Alexander me entristeceram, porque elas mexiam com o único sentimento que eu tinha dentro de mim: Léia e Mia. Ele praticamente me jogou na cara que eu não era nada para eles.
Ele já me tratava assim antes de partir e depois que ele se foi eu fiquei aliviada, pois já não aguentava discutir com ele. Sabia que briga entre irmãos era normal, mas ele não brigava com Mia. Era só comigo. Pensei algumas vezes que eu pudesse gostar dele ou ele de mim... Mas percebi que jamais poderia ter qualquer sentimento por ele a não ser o que eu sentia por minha amiga Mia. Ele não era o meu príncipe: nem o verdadeiro, nem o que eu tentava encontrar. E estava longe de ser... O meu príncipe jamais me faria chorar. Ele estaria sempre preocupado comigo e encheria meu coração de sentimentos bons que eu nunca senti antes. E eu faria tantas coisas com ele que jamais imaginei fazer... Depois eu o deixaria e seguiria minha vida, casando com o príncipe real e agora, sabendo de última hora, que partiria para o mundo dele que eu sequer conhecia. Se eu tinha motivos para chorar? Muitos. Mas eu não deixaria nada me abalar. Eu estava livre e isso bastava para acabar com a minha tristeza repentina causada por Alexander.
- Eu... Não vou voltar a fazer isso. Prometo. – ele disse.
Olhei nos olhos dele:
- Pouco me importa, Alexander.
Dizendo isso eu saí. Encontrei uma calça jeans perfeita. Eu já contei que meu maior sonho sempre foi usar calça jeans? Eu nunca pude ter uma peça jeans no meu closet, desde criança. Passei a mão pelo tecido duro e pensei se aquilo podia ser confortável. Mas se não fosse, por que todo mundo usava? Enquanto eu pensava, Mia, que reclamou da loja, estava com os braços sem espaço para levar mais nada. Ela veio até mim e viu meus olhos apaixonados pela calça:
- Jeans para balada? – ela perguntou.
- Sim. – falei pegando a peça.
- Hoje é seu dia, Satini e eu não vou contestar nada. Venha. – ela disse pegando minha mão. – Vamos escolher uma blusa.
Alexander continuava nos seguindo, como um guarda-costas.
- Desculpe meu irmão. Eu tenho certeza que ele não quis realmente lhe dizer aquilo.
- Não se desculpe por Alexander, Mia. Ele já é grande o bastante para saber o que diz. É realmente o que ele pensa. E eu não me importo... Está tudo bem.
- Eu nunca vi você chorar. – ela disse olhando nos meus olhos com ternura.
- Sempre há uma primeira vez. – eu sorri.
- Eu não queria que a primeira lágrima que eu visse nos seus olhos fosse causada pelo meu irmão. Sinto muito.
- Que blusa você acha que combina com esta calça dura? – perguntei, tentando mudar de assunto.
Ela riu alto:
- Calça dura... Essa é boa.
Acabamos escolhendo uma blusa branca num tecido de algodão, com alguns alfinetes que a adornavam. Era estranha, mas eu achei que combinava com a calça, embora não fosse nada o meu estilo. Eu só queria ser uma pessoa normal, pelo menos uma vez na vida.
- Estamos prontas, Alexander. – eu disse colocando minhas duas peças nos braços dele e depois pegando a pilha de Mia e colocando junto. – Pague, por favor.
Dizendo isso eu saí com Mia, esperando-o na porta da loja, pelo lado de dentro.

Book Comment (1292)

  • avatar
    ZéHenrique

    toma but

    30/08

      0
  • avatar
    SousaJessika

    simplesmente perfeito

    19/08

      0
  • avatar
    Gabriela Arajo

    Apaixonada pelo cuidado com a história♥️ estava com saudade de autores(as) assim! Parabéns!🎉

    18/08

      0
  • View All

Related Chapters

Latest Chapters