-Onde estou!?-Gritei em pânico, sentindo o frio da escuridão me envolver como uma mortalha. Eu estava sozinha, encolhida em um canto escuro, sem nenhum som ou luz para me guiar.
 Era uma sensação terrível, como se eu tivesse sido abandonada à própria sorte em um lugar sem vida. Era pior do que morrer, pois eu não sabia se algum dia sairia dali. Eu não sabia se alguém me procurava, se alguém se importava comigo. Eu não sabia nem quem eu era, ou por que estava ali.
 Mas então, eu vi algo que me chamou a atenção: um par de olhos brilhantes que me fitava com ódio. Eram olhos azuis gelo, que contrastavam com a escuridão. Eram olhos que me hipnotizavam, que me atraíam, que me assustavam. Eu não sabia quem era, mas senti um fio de esperança.
 Talvez ele pudesse me tirar dali, talvez ele soubesse o que estava acontecendo. Talvez ele fosse a minha salvação. Eu implorei por sua ajuda, com a voz trêmula e chorosa. Mas ele não se moveu.
 Ele apenas me observou com um olhar frio e cruel, como se eu fosse um inseto insignificante. Como se eu fosse a sua presa. E então, ele desapareceu, deixando-me novamente na escuridão. Eu não entendi o que ele queria de mim, mas estranhamente, eu senti falta dele.
 Ele era a única presença que eu tinha naquele lugar horrível, e por um momento, eu me senti menos sozinha. Mas agora, a solidão era ainda mais forte, e eu queria chorar e gritar por ele. Eu queria que ele voltasse, que ele me visse, que ele me reconhecesse. Eu precisava dele para saber que eu ainda existia, pois sem ele, eu estava perdida em um abismo sem fim.
Acordei do pesadelo com um soluço, tentando me acalmar. Meu rosto estava molhado de lágrimas, e meu coração estava apertado. Olhei em volta, e vi que estava no meu quarto, com os primeiros raios de sol entrando pela janela. Era um novo dia, mas eu não sentia nenhuma alegria ou esperança.
 Eu estava acordada, mas os sentimentos de traição e tristeza ainda me atormentavam. Era sempre assim, esse mesmo sonho, essa mesma angústia. Eu nem me lembrava direito do que acontecia no sonho, só dos olhos azuis gelo que me olhavam de longe, tão longe. E desses malditos sentimentos que não me deixavam em paz nem depois de acordar.
 Era enlouquecedor, eu odiava ter esse maldito sonho e acordar gritando e chorando. Eu odiava sentir essa dor no peito, essa saudade de alguém que eu nem conhecia.Olhei para o relógio na cabeceira da minha cama e vi que ainda tinha mais três horas antes de ter que ir para a escola. Eu sabia que não conseguiria dormir de novo, então levantei e fui até a minha mesa e abri o meu livro.
 Eu podia aproveitar o tempo para colocar o meu dever de casa em dia, já que não tive ânimo para fazê-lo no fim de semana. E teria que pensar em algo para dizer ao Charles sobre o motivo de eu estar gritando de novo. Ele era muito bom para mim desde que me encontrou na sua porta de madrugada há oito anos atrás. Ele me acolheu sem fazer perguntas, foi paciente comigo e respeitou o meu silêncio.
 Ele me disse que eu podia contar com ele quando estivesse pronta para falar com ele, e nunca exigiu nada de mim mesmo eu sendo tão fechada com ele. Em todos esses anos juntos, ele nunca foi mau comigo. Ele foi gentil quando me explicou o que eu era: uma nefilim, parte anjo e parte humana como ele. Só que eu era mais fraca, pois tinha mais características humanas do que angelicais.
 Mas isso nunca foi um problema para o Charles. Ele me deixou ficar e cuidou do melhor jeito que pôde de mim. Ele foi o meu anjo da guarda, o meu protetor, o meu amigo. Mas agora, com esses sonhos que eu estava tendo, ele estava constantemente preocupado.
 Ele queria saber o que estava acontecendo comigo, o que me assustava tanto. Mas eu não podia explicar nada a ele, pois nem eu mesma entendia por que os estava tendo em primeiro lugar. Como explicar o que não compreendia? E ele sempre me olhava com uma expressão curiosa, como se quisesse me perguntar algo.
 Mas eu sempre saía antes que ele tivesse a chance de falar alguma coisa. E hoje não seria diferente. Eu iria sair de mansinho e torcer para que quando voltasse, ele já tivesse esquecido de querer saber alguma coisa. Mas eu sabia que isso era impossível.
 Mais cedo ou mais tarde, eu teria que falar com ele. Mas eu iria adiar o máximo que pudesse.