logo text
Add to Library
logo
logo-text

Download this book within the app

Chapter 6 continua capítulo um

Parte 6
Ter sido filho de uma mãe solteira relaxada, preguiçosa, viciada em álcool e drogas não tinha sido fácil. Ele sofreu muito quando criança de várias formas, inclusive com o próprio desprezo e mau trato que vinha da mãe que o culpava por sua vida de merda e suas mazelas, como se ele, uma criança que veio ao mundo sem pedir, fosse o responsável pela desgraça de uma mulher irresponsável e louca que não tinha equilíbrio.
Muitas foram as vezes em que ouviu sua mãe dizer que ele tinha sido um erro e que só atrapalhava a vida dela. Não é fácil ouvir isso da boca de alguém que em tese, deveria te amar mais que tudo.
E ele ouviu muito isso. Ouviu tanto que depois de um tempo parou até de incomodar e já nem ligava.
Quando era pequeno ele chorou muito e nem entendia o motivo, não sabia porque estava apanhando, o que tinha feito de errado. E quando era adolescente ele teve muitas chances de ir pelo caminho errado e entrar para o crime, mas isso nunca passou por sua cabeça como opção pra uma vida diferente, para sair da miséria.
Nunca foi a favor de ir pelo lado mais rápido para mudar de vida e escapar do que vivia.
Falta de caráter é diferente de falta de opção. E ele nunca misturou as duas coisas usando isso como desculpa de vida difícil. É claro que a falta de oportunidades iguais gera uma revolta e problemas, onde muitos preferem ir pelo lado errado, mas ele conseguiu se segurar.
Chegando ao hotel foi direto para seu quarto. Abrindo a porta ele respirou fundo. Até que o quarto do hotel era confortável, mas não chegava aos pés do que estava acostumado.
Só que também passava longe da porcaria que chamou de casa durante muitos anos quando criança, até sair da pobreza.
Ele já sabia bem a diferença de cada mundo. Sabia o bom e o ruim da cada um deles.
Foi logo pegar os remédios para acabar com sua dor. Abriu o frigobar e pegou uma pequena garrafa de água mineral para tomar os medicamentos. Até parecia um velho se enchendo de medicamentos para isso ou aquilo, mas ainda eram precisos. Depois poderia abandoná-los.
Se tinha algo que chegava a irritá-lo muito, era sentir dor. E já estava há meses assim depois do acidente. Claro que aos poucos estava bem melhor, nem dava pra comparar de quando saiu do hospital, mas estava com muita no momento.
Ele não conseguia pensar bem assim, ficava agoniado. Separou a quantidade que sempre tomava de acordo com as receitas prescritas e virou tudo junto com a água, fechando os olhos e puxando o ar devagar. Sabia que dentro de alguns minutos estaria aliviado.
Uma coisa que o lembrava constantemente de que deveria mudar de vida, era sua cicatriz. Andou até o espelho, mirou seu rosto, virando devagar para ver a cicatriz feia e grande.
Apesar de algumas pessoas acharem que ele havia ficado traumatizado com o acidente, isso não era verdade.
O que havia acontecido era justo o contrário. Com o acidente ele havia parado para pensar e reavaliar as coisas. Estava preso em uma cama, então tudo o que podia fazer era pensar. E foi o que ele fez.
Passou a entender melhor o que estava acontecendo em sua vida e até dava graças a Deus pelo acidente. Foi como uma passagem necessária para um novo despertar.
Ele era assim. Esse tipo de coisa já tinha acontecido antes em sua vida. De vez em quando acontecia algum fato que o obrigava a pensar melhor.
E talvez precisasse se ligar mais nesses momentos de esclarecimento que a vida lhe dava.
Sua vida mudara e muito. Da pobreza para a riqueza. Tinha batalhado muito e gostava disso. Gostava de ter boas coisas, roupas caras de qualidade, dinheiro para custear sua saúde e seus luxos e merecia pelo esforço que fez pra subir na vida.
Muitas pessoas perdiam boas oportunidades por pensarem que não era certo ter coisas boas, mas não era assim. Não é pecado nem errado gostar de coisas caras e boas.
É uma grande hipocrisia dizer que dinheiro não é importante. Todos precisam de dinheiro para viver. Não é fácil, nem barato viver no mundo atual, onde tudo gira em torno do capitalismo. é claro que precisamos ter dinheiro.
Como fazer quando se tem um problema grave como aconteceu com ele? Se não tivesse como pagar pelo tratamento e pelas cirurgias, com certeza teria morrido.
Não é o amor que move o mundo, é o dinheiro. Ele era a prova real disso. O quanto sua vida havia mudado?
Perdeu muita gente de sua infância. Muitos de seus amigos haviam morrido por ter escolhido o caminho errado, pelo desejo de conseguir dinheiro rápido sem pensar de verdade como as coisas acontecem.
Alguns morreram pela mão dura dos policiais e outros pelos traficantes que cobravam o preço alto de viver nesse meio. São poucos o que conseguem sair desse meio.
Ele não queria isso para seu futuro. Não queria esse peso, esse estresse. Tinha medo de ser o próximo e já vivera muitos momentos ruins em casa para ainda procurar mais nas ruas. Já bastava o que aprendera com o desprezo de sua mãe.
Ele cuidava de si mesmo e de mais ninguém. Tentava se controlar para não cair na tentação. Não cobrava nada, mas não dava nada também. Fazia o que era necessário.
Estava em Torres para seu merecido descanso e relaxamento. Para buscar o que sentiu falta. Iria tirar um temo para fazer a mente trabalhar de outra forma.
Iria começar seu tempo sabático de descanso.
Em pesquisas quando estava deitado na cama do hospital, ele tinha visto em uma revista uma propaganda sobre um local pitoresco que estava sendo muito falado por causa da época de Natal que se aproximava. Depois viu uma reportagem em um jornal da noite sobre o mesmo lugar, mostrando a decoração da cidade que tinha sido feita em sua maioria pelos moradores do lugar.
Não era ligado em datas festivas, mas ficou interessado ao ver as luzes que piscavam bonitas. E depois buscou na internet mais informações sobre a região e acabou gostando do que viu.
Não era uma cidade grande, isso já o interessou. Estava um pouco cansado, mesmo antes do acidente, de tantas cidades cheias de barulho, gente de um lado para outro, a falta de educação e tudo mais dos grandes centros.
Torres era pequena e parecia bem aconchegante. Viu as fotos e alguns vídeos de eventos locais. Tinha uma paisagem bonita e pitoresca e parecia ser um local bem calmo. Era bem o que ele precisava para reorganizar as energias e a vida.
Agora estava ali, olhando pela janela e mirou a paisagem lá fora. A cidade era plana e tinha poucos prédios o que era ainda mais bonito. Deixava tudo mais espaçoso.
Cidades grandes são muito bonitas, com sua arquitetura moderna, seus prédios altos, suas ruas asfaltadas cheias de avisos pintados. Era um estilo diferente. Mas estava um pouco cansado da selva de pedra que era a cidade grande por outro lado. Também tinha seu lado feio, com tudo seco e cinza em algumas áreas. E era estressante viver entre prédios o tempo todo. De vez em quando até é bom, mas depois de um tempo isso meio que vai ficando grudado em você e ficamos mais fechados.
Já em Torres a paisagem lá fora era ampla. Agora nevava um pouco menos do que no momento em que dava carona a Margô. Gostou das luzes acesas que davam um ar quase de filme á cidade. Muita coisa estava fechada devido o horário, mas ainda tinha movimento.
Foi a primeira vez que ele prestou atenção em decorações festivas. Antes isso passava batido para ele.
Havia muitos enfeites espalhados pelas ruas. Eram gnomos, pequenos papais Noéis, renas, bolas coloridas e outros detalhes. Agora conseguia ver porque antes não dava a mínima pra essas coisas. Ele nunca teve um natal feliz, então porque motivo se importar.
Sempre esteve sozinho, o que era até melhor. Sua mãe estava bêbada ou drogada nessas datas. Não é uma boa lembrança do natal para uma criança.
Ele passou fome tantas vezes quando pequeno, que quando comia algo que alguém lhe dava, parecia um animal faminto.
Certa vez, já adolescente, estava se sentindo cansado de caminhar em busca de emprego e sentou em um chafariz no centro da cidade para tomar um ar enquanto descansava.
Ficou olhando a folha de jornal que tinha em mãos, buscando os classificados de emprego, para ver se achava algo que pudesse se candidatar, com a pouca experiência que tinha.
Nesse momento, passou uma senhora e colocou umas moedas no chão em frente dele. Aquilo bateu forte nele e foi a gota d´água pra sua revolta contra a vida que levava e o sistema falido.
Já não dava mais para suportar tal coisa.
Com raiva, pegou as moedas e atravessou a rua, até um mendigo do outro lado e as deu para ele. Não foi orgulho, apenas não queria ser visto dessa forma porque ele era capaz de fazer algo diferente com sua vida. Ele sentia pena do homem, mas aos olhos daquela mulher ele não era diferente daquele pobre homem e isso o revoltou muito.
Com raiva seguiu seu caminho e só chorou quando chegou em casa e decidiu que sairia daquela situação complicada. Passou um bom tempo pensando e avaliando o que poderia fazer.
Sabia que precisava estudar para não ser manipulado por pessoas sem escrúpulos, mas decidiu que tinha que ir atrás e depressa de uma mudança. Abandonou a escola com quinze anos.
Como era alto e tinha um porte altivo, mesmo magrelo, isso o deixava com a aparência de mais velho aos olhos de quem não o conhecia e não sabia sua real idade.
Autora Ninha Cardoso

Book Comment (3293)

  • avatar
    Tiago Lucas

    amei❤️

    1h

      0
  • avatar
    Raissa

    aplicativo legal

    1d

      0
  • avatar
    RrtBleke

    ótima

    6d

      0
  • View All

Related Chapters

Latest Chapters