AMELIA LEAL Chegar a maior idade costuma ser um grande marco para a maioria dos adolescentes, a euforia da tão sonhada independência e falsa liberdade, mas não para mim. O vestido caro e elegante que alguém do marketing do meu pai escolheu está deitado sobre minha cama faz meia hora e tudo que consigo sentir é frustração. Eu ainda quero fugir e ligar o foda-se para todo mundo dessa casa, mas não é tão fácil e por mais que eu queira pegar minha mochila, encher com roupas simples e sumir do mapa, Augusto me encontraria a onde quer que eu fosse. Preciso ser paciente a calma, assim como fiz ano após ano, esperando, ansiando pelo dia que nada poderia me prender. Aceitei que meus aniversários se transformassem em eventos políticos e sociais para planejar. Suspiro, aliso o tecido rendado do vestido negro e passo pelos meus braços, virando para encarar minha imagem no reflexo do espelho quando já estou por inteira vestida. O modelo abraça minhas curvas e ressalta a cor esverdeada dos meus olhos cobertos por uma maquiagem simples, o pequeno decote em forma de coração é discreto comparado com a grande abertura na lateral, revelando a pele pálida da minha coxa. Meu cabelo está bagunçado, como se eu tivesse penteado com os dedos ou deixado secar naturalmente, ao menos, isso foi escolha minha. A festa está barulhenta, o DJ toca músicas atuais e a maioria dos convidados, estão jogados na pista, dançando de forma eufórica. A mídia não foi permitida aqui dentro, nem mesmo os convidados terão permissão para gravar ou fotografar. Pelo menos, não enquanto meu pai estiver circulando. Sorrio para alguns convidados, alguns conhecidos e outros nem tanto. Aproveito o momento de distração que meus pais se encontram e escapo de fininho rumo ao bar. Ajeito a máscara de renda preta que cobre metade do meu rosto, apenas para assegurar que ela está no lugar certo. Bato no balcão para chamar a atenção do bar man e sorrio ao constatar o quão bonito ele é. O moreno corresponde e sorrir de volta, mostrando uma covinha para lá de charmosa no canto esquerdo da boca. — O que a senhorita deseja? Sinto minha pele esquentar com os pensamentos que surgem com sua pergunta. — Campari, por favor. Ele arqueia uma de suas sobrancelhas, me avaliando por inteira, provavelmente julgando meu pedido antes de assentir e estender o copo na minha frente. — Quantos anos você tem? — Pergunta com interesse, apoiando às duas mãos no balcão, fixo no meu rosto. — Idade suficiente para provar bebida de verdade. — Uma voz desconhecida fala. Um homem alto, com uma máscara cobrindo só metade do seu rosto, usando blusa social negra com as mangas levantadas até a parte dos cotovelos surge bem ao meu lado, puxando um dos bancos e se sentando sem nenhum convite. Franzo o cenho, fazendo cara feia. Não consigo visualizar seu rosto com precisão por conta da máscara, mas tenho a sensação de familiaridade e me contorço por dentro com a possibilidade de ser algum dos filhos desses políticos meia boca, a droga dessa festa está cheia deles. — Já tenho minha bebida.— Falo, aproveitando para tomar um gole dela. Com o canto dos olhos observo que é a vez dele de fazer cara feia. — Isso é bebida de gente fresca. — Sibila. Torço o rosto. Voltando minha atenção para ele, ignorando que ele acabara de me chamar de fresca e tento soar educada, levando em consideração que ainda não sei sua identidade, embora pareça que ele sabe quem sou. — Com licença. — Falo, me pondo de pé, deixando até mesmo minha bebida para trás. Ele se levanta, agarrando meu braço e me impedindo de prosseguir, encaro sua mão e depois seus olhos escuros. O bar man já nos deixou para atender outras pessoas faz um bom tempo, olho a nossa volta checando se tem alguém prestando atenção. — Quem é você? — Questiono. — Sabe quem eu sou. — Responde, me fazendo estreitar as sobrancelhas em confusão. Ele está próximo o suficiente para poder sentir o aroma forte do seu perfume. Lembra-me madeira molhada. — Não consigo enxergar seu rosto. — Falo, me justificando. Comprimindo mais os olhos, tentando pegar algum detalhe que me relembre Alguém. — Eu te reconheci mesmo de máscara. — Fala e eu bufo em resposta. — Ela é transparente, não esconde muita coisa. — Você tem razão. — Concorda comigo. — Vai soltar meu braço agora? — Pergunto, encarando seus dedos que ainda apertam, não tão forte, a pele desnuda do meu braço. Ele sorrir, embora não mostre seus dentes. — Claro, garota bonita. Você vai me deixar te mostrar o que é bebida de verdade? — Fala, largando meu braço. O olho com incredulidade. O cara chega na maior pretensão, agarra meu braço e ainda pensa que ficarei aqui bancando a boa anfitriã? — Não conte com isso. O sorriso dele se alarga, dessa vez mostrando os dentes bonitos. — Eu sei que vai, serei o ponto alto do seu aniversário. A melhor coisa que vai te acontecer nessa noite. Abro a boca para retrucar, dizer qualquer coisa que expulse a sua pose arrogante, mas a imagem de Aurora e Pedro na entrada da boate me faz mudar de ideia. Talvez eu precise de uma bebida forte para me manter sã durante a noite toda. — Você vai me dizer seu nome? — Pergunto, voltando a me sentar no banco do bar. — Duas doses de tequila, por favor. — Ele pede ao bar man, ignorando minha pergunta. — Eu não bebo tequila. — Falo. — Você é chata. Sua vida parece chata. Você deve beber muita tequila hoje. — Aqui está. — O Ricardo, o nome que li no crachá do bar man que ele pediu nossas bebidas fala. Depositando a tequila em copos pequenos na nossa frente, depois um pequeno recipiente de vidro com sal e um prato com pedaços de limão. — Franzo o cenho, não entendendo exatamente o porquê do limão. — Assim. — O desconhecido, como eu resolvi chamá—lo fala. Ele pega um pouco de sal e coloca no torço da mão, lambendo em seguida, vira o copo com a tequila de uma vez e depois morde o limão, fazendo cara feia no final. — Isso não parece bom. — Comento. — É fenomenal, Amélia. — Diz, falando meu nome pela primeira vez, soando estranhamente natural. — Quem é você? — Volto a perguntar. — Sua vez. — Empurra o copo com a bebida em minha direção, faço exatamente o que ele fez, seguindo a mesma sequência e imitando todo o processo. A bebida queima quando engulo. — Aqui. — Diz. Trazendo o limão para os meus lábios. — Abra a boca e chupe, pode morder se quiser, acredito que o efeito é mais rápido assim. — Faço o que diz. O limão amenizou o gosto da tequila, dando um novo sabor a bebida. Sorrio. — Não é ruim. — Digo. — Mais uma rodada. — Ele fala. Nós já tínhamos virado mais de cinco copos cada, quando tudo começou a rodar e disparei a rir como uma doida de tudo, qualquer coisa mesmo. Ele pediu uma garrafa d'água e me abanou um pouco, usando as próprias mãos, sorrindo. Eu me senti feliz pela primeira vez naquele dia, mas provavelmente teria uma ressaca no dia seguinte. Estreito os olhos para a imagem se formando a minha frente, a loira bonita parece tensa me encarando de longe, cochichando para o homem que enlaça sua cintura. Desvio meu olhar para ele, os olhos preocupados e carinhosos me vistoriam de forma lenta, uma chama se acende dentro de mim. Paro de respirar, balançando com a cabeça em negação, achei que esses sentimentos já tivessem passado. Deve ser o maldito álcool. — O que foi? — O desconhecido pergunta. — Minha irmã está vindo para cá. Falo, sentido-o tensionar ao meu lado. Penso em perguntar se ele está bem, mas minha cabeça volta a girar e tenho que fechar os olhos para voltar ao normal. — Tenho que ir. — O desconhecido diz. Abro os olhos a tempo de vê-lo mergulhar no meio das pessoas e se perder entre elas. — Droga, ela está bêbada. — A voz estridente de Aurora chega aos meus ouvidos. Viro para encará-la de frente, mas quando faço o movimento brusco, outra tontura me bate e tudo fica escuro.
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0amei 💖 😍 muito bom, boa escrita envolvente 👏👏👏👏👏
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